Eu sempre fui muito fã de "José Nêumanne Pinto", pelo seu estilo de comentar, faz uma crítica objetiva e direta, mas confesso que ultimamente tenho ainda mais apreço depois que soube que ele era natural de Uiraúna no sertão paraibano, apesar de eu ser natural de Teresina tenho me dedicado ao estudo do sertão paraibano,cidades como: Sousa, Campina Grande, Cajazeiras, sobretudo a região da Ribeira do Rio do Peixe, em busca de notícias de meus antepassados de sobrenome "Galiza" que fundaram a atual Uiraúna. Também gosto muito de escrever, amo história , dizem que matamos nossos mortos pela segunda vez quando o esquecemos e Tolstoi disse que se você quer ser eterno fale de sua aldeia, conte como vive seu povo, eu sigo esse conselho, vou escrever sobre meus antepassados.
Encontrei esse artigo que fala um pouco sobre essa personalidade uiraunense, quando ele recebe o título de cidadão paulista. Ele fala tão bem como escreve, é uma mente brilhante, foi bastante elogiado.
SESSÃO SOLENE 04/11/2010
O SR. PRESIDENTE (Quito Formiga - PR) - Está aberta a sessão. Sob a proteção de Deus, iniciamos os nossos trabalhos. A presente sessão solene destina-se à entrega do Título de Cidadão Paulistano ao jornalista, poeta e escritor José Nêumanne Pinto, nos termos do Decreto Legislativo 38, de 07 de julho de 2010.
Convidamos para o seu pronunciamento o Sr. João Mellão Neto, Deputado Estadual.
O SR. JOÃO MELLÃO NETO - Quero dar um testemunho muito rápido sobre quem é José Nêumanne, embora todos saibam. Conheci o Nêumanne em 87. Ele, Jornalista do Estadão, eu, na época Secretário Municipal da Administração. O Nêumanne era diretor de política do Estadão. Comecei a escrever no jornal em 1987, eu tinha um problema em relação ao Nêumanne: ele sempre era melhor do que eu. Escrevia artigos, publicava às sextas-feiras, ele publicava às quartas-feiras e sempre me tirava os argumentos. O que eu escrevia na sexta, ele escrevia na quarta, depois eu tinha de mudar tudo. E a gente vem convivendo através dos anos assim.
Meu primeiro livro quem prefaciou foi o Nêumanne, li todos os livros dele. Conheço o Nêumanne há tantos e tantos anos, homem de uma cultura fabulosa, grande jornalista, hoje, em várias mídias.
Parabéns, Nêumanne! Você veio de Uiraúna, cidade da nossa ex-Prefeita Erundina, para São Paulo e venceu. Você venceu! Hoje é um dia que demonstra bem isso. Você venceu, cada um pode apontar mil motivos, eu aponto um só. Você merece! Um abraço. (Palmas)
A SRA. CECILIA DE ARRUDA - Com a palavra a Deputada Federal Luiza Erundina.
A SRA. LUIZA ERUNDINA - Senhoras e senhores, saúdo a mesa, as autoridades presentes no plenário, os membros da Mesa. Agradeço ao nobre Vereador Quito Formiga pela iniciativa, sinto-me igualmente honrada, homenageada por V.Exa. ter conferido o Título de Cidadão Paulistano a este conterrâneo nordestino de Uiraúna e muito amigo nosso, meu querido José Nêumanne. Aproveito a oportunidade para agradecer aos paulistanos e paulistas por nos acolherem aqui na sua cidade, no seu Estado e nos darem a oportunidade de realização pessoal, profissional, humana. É um momento de grande satisfação para mim e a oportunidade de agradecer.
Nós, evidentemente, distribuímos por todo o País, filhos de famílias pobres como a minha que migrava a cada seca que acontecia naquela região e nos espalhávamos, já que éramos famílias numerosas, pelo País todo, por diferentes Estados dessa grande Nação que é o Brasil. E vamos nos encontrando pela vida afora, como aconteceu aqui.
Encontrei-me com José Nêumanne em São Paulo, pois não o conhecia pessoalmente. Saí muito criança de Uiraúna para poder estudar em casa de parentes, e foi nesta cidade maravilhosa, generosa, acolhedora que encontrei esse grande uiraunense, esse grande paraibano, esse grande brasileiro que é José Nêumanne, intelectual, jornalista, escritor, poeta e todos os títulos mais que lhe pudermos atribuir. Sem dúvida nenhuma, São Paulo é enriquecida ao torná-lo seu cidadão.
Nós, que viemos de outras regiões, de outros Estados, somos muito gratos a São Paulo, cidade que ajudamos a construir. E, a partir dela, construímos o Brasil. Com essa homenagem a José Nêumanne, sinto-me também homenageada e agradecida a esta Casa, a qual tive o privilégio de integrar como Vereadora. Nêumanne, esta é uma noite particularmente gloriosa para mim e creio que também para todos os paraibanos presentes. Que aqueles que se encontram nas distantes regiões e Estados do Nordeste, saibam que você está sendo homenageado pelo povo de São Paulo, pela Casa de Leis de nossa cidade, sendo acolhido, reconhecido e declarado filho de São Paulo.
Agradeço particularmente ao Vereador que nos deu a oportunidade de homenagear esse nosso amigo e conterrâneo e, sobretudo, conferir-lhe essa grande honra que é ser declarado cidadão paulistano. Muito obrigada a todos. (Palmas)
A SRA. CECILIA DE ARRUDA - Registramos e agradecemos a presença do Ministro Rogério Magri.
Convidamos, para seu pronunciamento, o Sr. Francisco de Sales Gaudêncio, Secretário de Estado da Educação da Paraíba.
O SR. FRANCISCO DE SALES GAUDÊNCIO - Boa noite a todos. Sr. Presidente desta sessão solene, Vereador Quito Formiga, ao cumprimentá-lo, cumprimento os demais integrantes da Mesa, as digníssimas autoridades aqui representadas. Cumprimento, sobretudo, D. Mundica, mãe de José Nêumanne, que está presente ao lado do filho, do neto, do bisneto Pedro e das noras, e estendo meu cumprimento à Magdala e aos demais familiares. (Palmas)
Expresso minha satisfação de estar presente hoje homenageando José Nêumanne em meu nome, pois ele é integrante da Academia Paraibana de Letras, e em nome do Governador da Paraíba, José Targino Maranhão, de quem tenho a honra de ser Secretário da Educação e Cultura. Ao dizer isso, expresso também a satisfação de conhecer o trabalho de José Nêumanne no campo do jornalismo, da literatura, da poesia. A Paraíba sente-se muito honrada ao entregar à cidade de São Paulo, ao Estado de São Paulo, a sua paraibanidade, a sua competência e, sobretudo, a sua humanidade.
Nêumanne é um humanista, é um brasileiro que dignifica qualquer cidadão brasileiro. Quem priva com sua pessoa sente-se cada vez mais brasileiro. Essa brasilidade parte de sua amizade, de sua competência, de sua lealdade e, sobretudo, da paraibanidade presente, sem nunca perder o maiúsculo da brasilidade. José Nêumanne, não vou fazer discurso. Estou emocionado, porque não me preparei para falar neste momento. Só quero dizer à cidade de São Paulo: Obrigado, porque José Nêumanne merece muito mais do que isso. Obrigado. (Palmas)
A SRA. CECILIA DE ARRUDA - Anunciamos as palavras do Secretário Andrea Matarazzo.
O SR. ANDREA MATARAZZO - Queria cumprimentar os Srs: Prefeito Gilberto Kassab; Francisco de Sales Gaudêncio, Secretário de Estado da Cultura da Paraíba, neste ato representando o Governador do Estado da Paraíba; nobre Vereador Quito Formiga, Presidente desta sessão solene; José Nêumanne Pinto, nosso querido concidadão a partir de hoje; Deputada Federal e ex-Prefeita Luiza Erundina; ex-Ministro Antônio Rogério Magri; Deputado Estadual João Mellão Neto; Danilo Santos de Miranda, Diretor Regional do Sesc; nobre Vereadora e Deputada Mara Gabrilli.
Queria dizer, muito rapidamente, a honra que é para nós, paulistanos, recebermos pessoas como as que estão aqui, em especial o José Nêumanne, nosso homenageado.
São Paulo é uma cidade interessante que atrai o sucesso. Só da Paraíba, nesta sala, temos o Quito Formiga, cujo pai, Eurícledes Formiga, veio para São Paulo, exerceu diversas atividades e tem um filho Vereador da nossa cidade. O Eurícledes Formiga acolheu o José Nêumanne Pinto, que saiu também de Uiraúna e veio para São Paulo. Se não me engano, foi quem encaminhou José Nêumanne à Folha de S.Paulo, local que trabalhou com Cláudio Abramo. E a Deputada Luiza Erundina, que saiu de Uiraúna, também veio para a região Sudeste, chegou a São Paulo e aqui foi tudo que alguém possa querer na vida pública, inclusive e principalmente, Prefeita desta grande cidade.
Então, temos de agradecer muito à Paraíba pelos personagens que cedeu a esta cidade; à São Paulo por ter sabido receber essas pessoas e por tê-las fixado na Cidade.
Vereador Quito Formiga, parabéns pela merecidíssima homenagem ao José Nêumanne, que é, além de um grande jornalista, um grande batalhador pela democracia, pelos direitos das pessoas, um grande escritor e principalmente um grande poeta, um personagem da nossa cidade, quase mais paulistano do que eu mesmo, de tanto tempo que está na Cidade e de tantas marcas que deixou aqui.
Eu nem sabia, Nêumanne, que você não era cidadão paulistano, que já não tivesse o Título de Cidadão Paulistano. Assim, é com muita honra que estou presente nessa homenagem e muito honrado também com a presença da Prefeita Luiza Erundina, que é uma referência da mudança política da nossa cidade. São Paulo é cosmopolita, São Paulo tem diversidade, todo mundo tem oportunidade e a Luiza Erundina simbolizou um momento de mudança grande, uma paraibana certamente cidadã de São Paulo, de fato e de direito. (Palmas)
José Nêumanne, tenho esse privilégio de ser seu amigo, de ter trabalhado com você em Brasília, de ter sido indicado por você para um cargo. Aliás, eu diria que devo ao José Nêumanne a minha entrada na vida pública: foi uma indicação dele. Gostei e nunca mais saí. Nêumanne, queria lhe dar os parabéns. Para mim realmente é uma honra estar aqui. Acho que para São Paulo tem o privilégio de ter você hoje como um concidadão. (Palmas)
A SRA. CECILIA DE ARRUDA - Anunciamos as palavras do Presidente e proponente desta sessão solene, Vereador Quito Formiga.
O SR. PRESIDENTE (Quito Formiga - PR) - Queria cumprimentar inicialmente o jornalista, poeta e escritor José Nêumanne Pinto, nosso homenageado; cumprimentar os Srs. Gilberto Kassab, Prefeito da cidade de São Paulo; Francisco de Sales Gaudêncio, Secretário de Estado da Educação e Cultura da Paraíba, neste ato representando o Governador da Paraíba José Targino Maranhão; Deputada Federal Luiza Erundina; Andrea Matarazzo, Secretário de Estado da Cultura de São Paulo, neste ato representando o Governador Alberto Goldman; Deputado Estadual João Mellão Neto; e a família do Nêumanne, que veio nos prestigiar nesta noite.
Senhoras e senhores,
"... Poeta é que nem criança,
Só mesmo livre é feliz,
Se brinca com coisas sérias,
Cobre de luz o que diz;
Dono de ruas e estradas,
Assim poeta me fiz! ..."
Inicio a minha fala neste momento solene com alguns poucos versos de um poeta querido, que nos traz tanta saudade, um paraibano notável de São João do Rio do Peixe. Era uma vez o "Formiga", que carregava esse pseudônimo, que nem era o sobrenome de sua própria família.
Assim como Françoise Marie Arouet, que tinha o seu pseudônimo, o poeta francês Voltaire, José Eurícledes Ferreira também, o Eurícledes Formiga, e eu posso afirmar: "Ele não morreu: permanece imortal em nossas vidas!". Relembrá-lo é uma viagem saborosa.
É verdade que nós, seus filhos, e Annabel, sua companheira, aqui presente, somos os principais suspeitos para falar a respeito dele em tudo o que foi - e foi tanta coisa -, foi singular e foi plural. O menino alegre de um sertão triste.
Amigo verdadeiro e amigo verdadeiro de José Nêumanne Pinto, o outro sertanejo paraibano nascido em Uiraúna. Poeta, jornalista e escritor que chegou em São Paulo e assim como o Formiga, amigos de ruas e estradas, dizia em suas rimas.
Creio que meu pai ainda está vivo, com certeza ao nosso lado, apoia e lidera esta iniciativa. Creio sinceramente que, de onde ele está, no plano espiritual, meu querido e saudoso pai aprova e abençoa esta cerimônia com a alegria nordestina que sempre lhe foi peculiar, porque, em vida, foi o amigo que deu largas e inequívocas provas de que gostava muito do nosso homenageado.
Professor na arte de escrever, jornalista de raro talento, pensador da melhor qualidade, José Nêumanne Pinto é como um cirurgião de ideias, que as seleciona, aparta, disseca, aprofunda, compreende e só então reparte o fruto dessa investigação generosamente com seus semelhantes.
A missão de José Nêumanne no mundo: creio seja a de, indelevelmente, demarcar a sua passagem como aquele que, de origem humilde, de súbito se revela ao País como um titã das ideias, um menestrel da palavra, um comunicador profícuo e sobejamente generoso.
Há muitas pessoas das quais se podem contar feitos e fatos que as enobrecem. Mas há poucas pessoas das quais se possa falar de tudo isso, acrescido de emoção e gratidão, como acontece agora.
Falo hoje de José Nêumanne Pinto com um profundo sentimento de emoção, dado que me sinto na condição daquele que faz justiça, chamando para junto dele a justa e merecida honra em ser assim contemplado. Um paraibano paulistano ou um paulistano paraibano, dado o seu amor e a sua colaboração, o seu carinho e a sua alegria em enriquecer São Paulo com o seu dom de comunicador, seu profissionalismo competente, seu amor a esta cidade. Não se trata de revelação, dado que sua trajetória de vida é pública e notória. O talento, a competência e o caráter também. Não se trata, portanto, de apresentá-lo, dado que é figura pública. Trata-se apenas de reconhecer, oficialmente, os bons serviços prestados à cultura, à comunicação e à sociedade nesses anos todos, por parte desse homem que veio para fazer deste um planeta melhor e, desta vida, algo mais agradável de se viver, nos brindando o tempo todo com seu talento, sua inteligência e sua notável capacidade de pensar e comunicar.
José Nêumanne Pinto: muito me honra homenageá-lo! Minha homenagem é de respeito, admiração e gratidão. Formiga se alegra comigo!
Parabéns, Cidadão Paulistano! (Palmas)
A SRA. CECILIA DE ARRUDA - Solicitamos ao Vereador Quito Formiga e ao homenageado Jornalista José Nêumanne Pinto que se encaminhem à frente e ao centro da Mesa.
Neste momento o Vereador Quito Formiga fará a entrega do Título de Cidadão Paulistano ao jornalista, poeta e escritor José Nêumanne Pinto.
"Município de São Paulo, Título de Cidadão Paulistano. A Câmara Municipal de São Paulo, atendendo ao que dispõe o Decreto Legislativo 38, de 07 de julho de 2010, concede ao Sr. José Nêumanne Pinto o Título de Cidadão Paulistano. Palácio Anchieta, 04 de novembro de 2010. Antonio Carlos Rodrigues, Presidente; Chico Macena, 1º Secretário; Quito Formiga, Proponente; Raimundo Batista, Secretário Geral Administrativo; Breno Gandelman, Secretário Geral Parlamentar."
- Entrega do Título de Cidadão Paulistano ao Sr. José Nêumanne Pinto, sob aplausos.
A SRA. CECILIA DE ARRUDA - Convidamos a Sra. Maria Magdala de Brito Ramos, esposa do homenageado, para que receba nossas homenagens por meio de flores, das mãos da Sra. Simone, esposa do Vereador Quito Formiga.
- Entrega de flores à Sra. Maria Magdala de Brito Ramos, sob aplausos.
A SRA. CECILIA DE ARRUDA - E, para uma foto oficial, convidamos a família do homenageado: D. Mundica, sua mãe; Sr. José Nilton, seu irmão; Wladimir e Cecília, seus filhos; Sra. Patrícia, sua nora; e Pedro, seu neto; e a Sra. Anabel, mãe do Vereador Quito Formiga. (Palmas)
- Registro fotográfico.
A SRA. CECILIA DE ARRUDA - Tem a palavra o Sr. José Nêumanne Pinto, jornalista, poeta e escritor, o mais novo cidadão paulistano.
O SR. JOSÉ NÊUMANNE PINTO - Juro para os senhores que pensava começar falando aqui sobre homens. Vou começar falando de um hoje, Sr. Luís Gonzaga Mineiro, meu diretor no SBT, que me perguntou por que gosto de São Paulo. Fiquei pensando. A primeira coisa que ocorreu foi o seguinte: Apaixonei-me por uma mulher, que morava numa cidade muito linda, chamada Pessoa. Ela veio para cá e se apaixonou por esta cidade. "Diabos. Como não vou gostar de uma cidade como esta?" A segunda referência que me ocorreu é a respeito de outra mulher, pela qual também sou apaixonado, a minha querida amiga Luíza Erundina. Quando ela ganhou as eleições para a Prefeitura de São Paulo, todos falavam que, no Brasil, havia uma sociedade excludente, e que o brasileiro não tinha oportunidade para subir na vida. Pensava no exemplo dessa mulher, uma menina que nasceu muito pobre. Sobre ela, escrevi um livro, intitulado: Luíza Erundina, a mulher que veio com a chuva. Por quê? Porque, quando ela resolveu sair de Uiraúna para ir para Patos, no sertão da Paraíba, estudar no colégio dirigido pelo meu primo, Monsenhor Manuel Vieira, seu pai disse: "Se chover, você vai". Se chovesse, ele teria renda suficiente para mantê-la em Patos. Se não chovesse, não teria como ir. Como choveu, ela foi e chegou a ser prefeita na Terra da Garoa. Nesses dois exemplos de mulher, acho que me bastam talvez para definir o que um mineiro perguntou-me: "Por que gosto de São Paulo?" É evidente que tenho outros motivos que vêm de muito longe. Aí é que entram os homens na história.
Nesta madrugada, por volta de 3h, escrevi a última palavra do livro O que sei de Lula, que vai sair em dezembro. A última palavra que escrevi foi in memoriam: "José de Anchieta Pinto, Eurícledes Formiga e J. B. Lemos ".
Os senhores estão vendo que o nome de José de Anchieta Pinto refere-se a São Paulo. Afinal, José de Anchieta foi um dos jesuítas que ajudaram a fundar o colégio, que fica no Pátio do Colégio, no qual a Cidade surgiu. José de Anchieta Pinto era sertanejo, que me deu a vida e me ensinou lições básicas de como viver bem. A principal delas é que se deve viver honestamente, porque não há custo maior do que a desonestidade. Meu pai ensinou-me que na vida sobretudo temos de nos tornar dignos do dom da vida. Desde muito pequeno, desde a idade do meu neto Pedro, tenho noção de que tenho um talento especial ao lidar com a palavra. Nunca mereci isso. Então, o que posso fazer é ser digno desse talento, usando-o de forma decente. Aprendi isso com meu pai, José de Anchieta Pinto, que morreu com 59 anos, mais ou menos, na mesma idade que o segundo personagem dessa história, José Eurícledes Ferreira, o Formiga.
Os senhores não sabem o que perderam por não terem tido a oportunidade de conviver com o Formiga. Não há uma pessoa como ele, uma pessoa de uma cidade chamada São João do Rio do Peixe, a terra do Sales Gaudêncio, que conheço desde menino. Quando conheci o Formiga, já não fazia mais essas aventuras, mas contavam suas histórias. Ele tinha uma memória fotográfica. Se liam um texto para ele, repetia-o. Depois, falava ao contrário. Depois, dizia a primeira e a última palavra; a segunda e a penúltima; a terceira e a antepenúltima. Ele falava rapidamente o texto até chegar à palavra do meio. Quando se enumerava o texto e dizíamos o número, ele dizia a palavra. É absurdo, na época do computador e do gravador, uma pessoa que tem um talento como esse.
Ele era um boêmio. Frequentava um lugar chamado clubinho, clube dos artistas. Num dia, um poeta baiano resolveu mostrar um imenso poema. Formiga decorou todo o poema, e com sua voz grave, disse inteirinho. Quem havia feito o poema enlouqueceu. Pensou: "Como uma pessoa vai saber o poema que fiz?" O Formiga disse: "Eu decorei". Não acreditaram. Então, o Formiga disse o poema ao contrário.
Então, eu me considero um privilegiado, porque sou um cidadão paulistano hoje por causa do Formiga. Por que digo isso? Morava no Rio de Janeiro. Minha referência é de lá. Sou Flamengo, sou Mangueira. A minha cultura é de lá. A Paraíba sempre foi voltada para o Rio de Janeiro. São Paulo era como se fosse mais distante. O Rio era mais perto, fazia parte da nossa vida. Eu estava no Rio e fazia tudo ao contrário. Pessoas trabalhavam em São Paulo e passavam o fim de semana no Rio de Janeiro. Eu trabalhava no Rio e passava o fim de semana em São Paulo. Veio para cá um amigo meu, de França, chamado Arnaldo Xavier, um poeta negro, que morreu recentemente. Arnaldo veio morar em São Paulo, e nós nos encontrávamos muito. Ele tinha um amigo em Brasília chamado Hélcio Pires, um poeta de vanguarda, amicíssimo de Formiga. Eram colegas, funcionários públicos. Formiga, quando o conheci, não tinha mais essas brincadeiras de memória. Ele dirigia o Cartório da Justiça Federal, na esquina da Praça da República com a Rua do Arouche, de frente para o Colégio Caetano de Campos. Arnaldo me levou ao Formiga, por meio de Hélcio Pires, de quem tinha ficado amigo quando morou em Brasília, que indicou Formiga. Eu vinha do Rio e visitava Formiga. Aí descobri que Formiga era de São João do Rio do Peixe.
Para vocês terem uma ideia, quando nasci, em 1951, Uiraúna era distrito de São João do Rio do Peixe. Então, quando soube que Formiga era de São João, eu lhe disse que era de Uiraúna, e ele me perguntou de que família eu era. Respondi-lhe que era da família Pinto. E ele fez o seguinte comentário: "Engraçado, tinha uma família que morava do lado da casa do meu pai, que era da família Pinto. Era uma senhora cujo marido tinha matado um homem, e o pai mandou o irmão tomar conta dela". Era minha tia Florides; e o adolescente que tomava conta da minha tia era o meu pai. Falei disso ao Formiga, que, espantado, disse assim: "Aquele sujeito enchia o saco. Passava o dia inteiro tocando muito mal no pistom a música Os Pobres de Paris". E lhe confidenciei: "Passei minha infância toda ouvido essa droga dessa música". Então, Formiga me perguntou: "O que você quer ser na vida, garoto?" Eu lhe respondi que gostaria de ser jornalista. Queria ser geólogo, mas comecei a trabalhar no Diário da Borborema, em Campina Grande, em 1967, e resolvi ser jornalista. Eu me viciei pelo cheiro da tinta do jornal, pela rotina da redação. Ele falou assim: "Não volte ao trabalho amanhã, que eu vou levá-lo a um lugar". Pegou-me pela mão e me levou à Alameda Barão de Limeira, 425. Subimos até a sala de um senhor chamado Cláudio Abramo - simplesmente, o maior jornalista brasileiro da 2º metade do século XX. Era um sujeito bonito, elegantíssimo, italiano. E já usava, naquele tempo, a bengala, para fazer um charme, expediente que, à época, todos usavam.
Formiga nunca tinha lido nada do que eu tinha escrito. Mas, como Quito falou, Formiga é espírita. Então Formiga se vira para o Cláudio e diz assim: "Cláudio, você não sabe: este menino é um gênio". E Cláudio, que era um sujeito muito irreverente, se vira, olha para mim - um sujeito cabeçudo, sem pescoço, magro - e diz assim: "Moleque, tu não sabes a ‘responsa’ que tu estás assumindo aqui. Esse cara é muito amigo meu, hein. E é o seguinte: o que ele disse para mim é lei. Então, se ele disse que você é um gênio, você é um gênio. Agora, se você não for, você vai acabar com uma amizade muito antiga e muito boa, viu, moleque. Vá até o meio da redação, procure um sujeito chamado J. B. Lemos. Apresente-se a ele e diga que amanhã você trabalhará aqui". Hoje isso não existe mais. Fui, então, até o Lemos, que estava de férias, e terminei me apresentando ao Zé Aparecido, o segundo Lemos. E comecei. Precisava de uma gravata para usar no dia seguinte. Fizeram uma cota e me deram um terno. E assim comecei a trabalhar na Folha de S.Paulo. Cláudio falou o seguinte: "Se você for um gênio, fica; se não for, dança". Lemos voltou de férias, e foi, na minha vida, o que foram para mim meu pai e Formiga. Lemos foi o meu pai. Naquele tempo, jornalista viajava, ia para o exterior. Uma vez fui à Bolívia cobrir um assunto relacionado à cocaína. E me dava um desespero; não sabia o que fazer. Era um menino, inexperiente. Ligava para Lemos: "Chefe, estou desesperado. Não sei o que faço". E ele dizia assim: "Se vira". Sábias palavras. Eu me virava.
Percebam que tratamos de uma imensa comunicação espiritual, que não se explica racionalmente.
Lemos teve, além das seis filhas, um filho que morreu prematuro. Ele, que era goleiro do Rádio Clube de Mococa, gostaria de ter um filho, e eu acabei sendo o filho que ele não teve.
Aluízio Azevedo era do Partido Comunista, e Lemos tinha sido do Partido Comunista. Então, ele levava, à redação, material do Partido. Aluízio sabe. Eu trabalhava na Folha de S.Paulo, na Barão de Limeira, e na frente tinha um restaurante chamado Bandejão. Era um show. Lemos se levantava e dizia assim: "Pessoal, venham assistir um faminto, um sedento, 400 anos de sede os contemplam". Era eu, comendo feito gralha. E ele pagava o meu almoço.
Um repórter do Jornal da Tarde veio me perguntar qual foi a primeira sensação que tive de São Paulo. Arnaldo Xavier, meu amigo que me trouxe para São Paulo, achava que o Viaduto Santa Ifigênia era o lugar mais lindo do mundo. Até hoje, nós vamos ao Viaduto Santa Ifigênia, e ele considera o lugar mais lindo do mundo. Mas a minha memória é muito antiga, muito anterior a isso.
Meu pai era motorista de caminhão, e eu morava no sertão de Pernambuco, em Uiraúna. Vocês não têm ideia. Hoje, Uiraúna tem computador, tem site. Naquele tempo, não tinha luz elétrica.
Sabem como comecei a gostar de literatura?A minha mãe, D. Mundica, que está ali, sabia de cor todos os versos de Castro Alves. Quando a noite caía, a luz era acesa às 18h. Cabrinha ligava o motor da luz, e, às 21h, dava um sinal, depois dois sinais, depois três, e apagava, de uma vez. Então caía a treva sobre o sertão. Sabem o que é uma treva no sertão? É escuro à beça. Minha mãe, então, recitava versos de Castro Alves. Ela nos reunia na calçada, para ver se pegava algum vento, que, às vezes passava, perdido. E também ouvia os relatos do meu pai sobre o Brás.
O Brás, para mim, não é o Brás de Alcântara Machado - Brás, Bexiga e Barra Funda -, é o Brás dos nordestinos, não dos italianos, com o qual meu pai convivia. E a primeira coisa que eu fiz em São Paulo, quando vim, foi ir ao Brás.
A minha primeira mulher estudava em Mogi das Cruzes, na Faculdade de Medicina, e pegava o trem na estação do Brás. Eu ia para a estação e ficava andando pela Rua Cavalheiro, conhecendo coisas que talvez não existam mais, porque, na verdade, a São Paulo que eu amei é uma cidade que foi soterrada, criminosamente, por Prestes Maia e outros. A São Paulo que eu amei era a de Mário de Andrade. Ainda resistia.
Frequentava também a Confeitaria Americana, ao lado do Mappin, e aquele café da Barão de Itapetininga, a Confeitaria Vienense, na qual se tocava valsa. Você ia tomar um chocolate, e tinha valsa, com sujeito tocando violino e piano.
Quito não viu isso. E foi Formiga quem me ensinou o caminho. Guilherme de Almeida e Paulo Bonfim se reuniam com Formiga na Confeitaria Vienense, e Formiga me dizia: "Vai à Confeitaria Vienense. É um ambiente europeu". Eu comia no Um, Dois, Feijão com Arroz, que ficava na Rua Aurora, que o Mário de Andrade dizia: "Na Rua Aurora eu nasci; na aurora da minha vida fiquei pobre e fiquei nu". Então, para mim, esta cidade era a São Paulo de Mário de Andrade. São Paulo, que o Mário Chamie compôs um livro maravilhoso, magnífico, uma obra-prima da literatura brasileira, chamado A Pauliceia Dilacerada. Então, esta é a São Paulo da minha memória, aquela que aprendi a amar. Mas eu também amo muito o Rio de Janeiro.
Uma vez estava lá no meu jornal, e tocou o telefone. Era um sujeito da Paraíba. Um daqueles comunicadores de rádio. E o cara me disse assim: "Seu Nêumanne Pinto, imagine que, esta noite, a Rede Globo entrevistou a Elba Ramalho, depois que desfilou na Escola de Samba, e ela disse que era carioca! Isso é um absurdo. Elba Ramalho está renegando a sua origem sertaneja. O que você acha disso?" Eu lhe respondi: "Eu acho ótimo, porque eu também sou". "Como você é carioca? Você não é de Uiraúna?" "Eu sou de Uiraúna, mas eu sou carioca". Ué, eu sou de Uiraúna, mas eu sou campinense.
Quero lhes dizer: antes de ser cidadão paulistano, eu fui cidadão campinense, que para mim é motivo de muito orgulho, porque adoro Campina Grande, a cidade que me reencontro comigo. Formiga estava lá. Então, também sou paulistano.
Os melhores momentos da minha vida passei em São Paulo. Sabem qual foi o melhor momento da minha vida? O dia em que o meu filho Vladimir nasceu. Quando ele era um ratinho, de oito meses, murchinho, nascido com muito sofrimento da mãe, me veio uma emoção, uma coisa louca. Você não pode imaginar o que se passou no meu coração quando eu vi o meu filho na Maternidade São Paulo, que nem existe mais. Um dos símbolos da São Paulo que eu amo, que também é uma cidade que se renova, que se refaz e que destrói.
[...] À época, minha ex-mulher trabalhava no Hospital Matarazzo, e eu no Jornal do Brasil, na Av. Paulista. No Hospital Matarazzo nasceram as minhas duas filhas. Uma delas, a minha filha Clarice, que hoje mora em Milão, e é mãe das minhas netas milanesas, Estela e Ana, telefonou-me: "Pai, deixa de besteira. Você está sendo paulistano agora". Eu sou desde sempre. A minha filha Cecília, aquela mulher linda que está ali, quando nasceu, a minha ex-mulher, Regina, passou muito mal. E a médica que fez o parto me disse que dificilmente a criança sobreviveria, pois tinha um problema de má formação de membrana hialina. Eu trabalhava no Jornal do Brasil, e, entre uma reportagem e outra, ia para o berçário do Hospital Matarazzo, e chorava. Via aquela menina pequena, numa isolete, com a barriga subindo e descendo. E eu rezei. Porque quando a médica me falou isso, eu falei: "Eu já tenho um filho e uma filha. Está tudo bem". Mas quando eu vi aquela menina naquela isolete, tudo o que eu queria na minha vida é que ela sobrevivesse. Dava tudo por isso.
E tudo isso aconteceu em São Paulo. Por isso amo esta cidade, por isso ela é o meu amor, a comoção na minha vida, pois aqui vivi todos esses momentos.
Outro momento da maior alegria foi num sábado, quando eu me preparava para almoçar: chegam o meu filho e a minha nora. E o meu filho disse assim: "Pai, você vai ser avô". Você não sabe a alegria que eu tive. O nascimento do meu neto foi uma repetição daquele momento.
Miguel, assim como todos os meus amigos, é testemunha. Qualquer um que tenha recebido uma mensagem por computador sabe que o personagem mais presente no meu computador é o meu neto Pedro. Audálio Dantas, por exemplo, conhece Pedro desde que ele era bebê. Então, não me faltam motivos para ser paulistano.
Mas um dia eu estou lá na minha sala, no jornal, toca o telefone e uma moça me diz assim: "Sr. José Nêumanne, o Vereador Quito Formiga vai lhe conceder o Título de Cidadão Paulistano. E a Câmara tem a tradição de perguntar se a pessoa aceita, para não haver um vexame. O senhor aceita?" "Eu aceito, mas quero saber quem é este Vereador. Preciso conversar com ele. A senhora me põe ele na linha?" E eu disse assim: "Vereador, é um prazer muito grande receber o Título de Cidadão Paulistano, até porque sempre me considerei paulistano. O senhor é o primeiro a reconhecer isso. Então, eu gostaria que o senhor me indicasse o que o moveu a isso". Ele, então, me disse: "Minha mãe é sua fã. Você tem uma trajetória brilhante em São Paulo". Mas tudo isso eu resumo da seguinte forma: "Eu sou filho de Eurícledes Formiga". Por isso sou cidadão paulistano.
Muito obrigado. (Palmas)
A SRA. CECILIA DE ARRUDA - Para o encerramento oficial, anunciamos as palavras do nobre Vereador Quito Formiga.
O SR. PRESIDENTE (Quito Formiga - PR) - Recitarei alguns versos.
"Não sei o teu idioma, tua crença
Nem tua origem. Chamam-te estrangeiro,
Mas de onde quer que venhas, forasteiro,
Saúdo-o como irmão tua presença!
Se o mundo te feriu, esquece a ofensa,
Que herói é quem perdoa... Companheiro,
Pisas meu chão de amor como um guerreiro
E eu te ofereço a paz em recompensa!
Ouve minha canção, não de quem chama,
Por seus clarins, exércitos feridos,
Legiões de ódios, corações em chama!
Mas almas que ardem no ideal sagrado,
Os batalhões humildes dos vencidos
Só ao fogo de Deus, maior Soldado"
Nêumanne, você é um soldado da paz, do amor e da alegria. Ofereço estes versos de Formiga em homenagem à sua alma guerreira.
Está encerrada a sessão.